Magia e cura entre os indígenas
Desde os tempos mais remotos da humanidade, o homem procurou meios para evitar, ou curar doenças. Observando plantas e animais, começou a distinguir o que poderia ser utilizado como elemento medicinal.
Para os brasis, esse conhecimento empírico foi passado de geração em geração, formando um conjunto de práticas que chegaram até o índio do período colonial. Esse conhecimento, hoje conhecido como fitoterapia, era de domínio dos índios de todas as partes do Brasil, apenas variando por influência de características culturais e do conjunto de plantas das floras regionais.
Com a sua enorme biodiversidade observada pelos europeus, desde os primeiros relatos, o Brasil oferecia ao índio, uma grande possibilidade de se obter plantas medicinais. Há milhares de anos como nativo da terra, o índio, atento observador da natureza, conseguiu catalogar, através de seus pajés, drogas que formaram a sua grande farmacopeia. Aliadas a rituais, essas drogas eram a sabedoria das selvas, faziam com que os pajés fossem figuras de respeito em toda tribo, sendo os guardiões das receitas mágicas e seus feitiços.
Com a sua enorme biodiversidade observada pelos europeus, desde os primeiros relatos, o Brasil oferecia ao índio, uma grande possibilidade de se obter plantas medicinais. Há milhares de anos como nativo da terra, o índio, atento observador da natureza, conseguiu catalogar, através de seus pajés, drogas que formaram a sua grande farmacopeia. Aliadas a rituais, essas drogas eram a sabedoria das selvas, faziam com que os pajés fossem figuras de respeito em toda tribo, sendo os guardiões das receitas mágicas e seus feitiços.
Com o objetivo de explorar comercialmente o Novo Mundo, dividido no Tratado de Tordesilhas, os europeus uniram o poder temporal ao espiritual, no comando de sua grande empresa. Ao chegar a Terra de Vera Cruz, Caminha, em sua carta ao rei de Portugal, dom Manuel, observou as belezas, as aves estranhas, a sua gente inocente com sua nudez que mostravam sem nenhuma vergonha, mas considerou os nativos muito selvagens e “o melhor que os portugueses podiam fazer seria salvar aquela gente”.
Considerando um povo sem Deus, os padres portugueses passaram a ver as práticas indígenas como demoníacas. Ao longo do período colonial, fizeram os brasis perderem grande parte de sua cultura, incluindo aí, os segredos da cura, riqueza adquirida ao longo de milhares de anos e extraída das florestas.
Uns dos primeiros relatos sobre a maneira como os índios se medicavam foi feito pelo cronista francês, Jean de Léry, em seu livro História de uma viagem a terra do Brasil, de 1578, no capítulo XIX, dedicado a práticas indígenas relativas às doenças e a morte: “Se acontece adoecer um selvagem, dá logo a conhecer em que parte do corpo lhe dóe, sendo esse lugar chupado com a bocca por algum amigo ou pelo pagé, embusteiro de genero diverso do carahiba e correspondente ao nosso barbeiro, ou medico. Os pagés fazem crer aos doentes que lhes arrancam a molestia do corpo e lhes prolongam a vida”.
A maioria dos índios da América considerava que o criador fez o homem através da música. Esta era o canal de comunicação com os espíritos que traziam saúde e as outras sabedorias transmitidas ao pajé, que tinha o poder de receber as mensagens e passá-las para a tribo, através de cantos. Cabia ao ente espiritual, determinar qual erva iria salvar o enfermo, tudo isso ao longo de rituais intermináveis. Vem daí, a grande importância da música, do canto e da dança para os índios.
A flauta, o maracá, tambores e cachimbos eram objetos de adoração do povo das selvas, que acompanhavam os índios em vários rituais, incluindo o de cura. Após muita bebida, como o cauim, bebida alcoólica feita através da fermentação da mandioca ou do milho, muito canto e dança, a música revelava o tratamento escolhido pelos espíritos para recuperar o doente: banhos, dietas, aplicação de calor e defumação, massagens, fricções, vômito, beberagens à base de plantas medicinais, escarificação no tórax e locais inflamados com objetos pontiagudos como dentes de animais, e até o isolamento do enfermo.
Para o pajé, a grande via de ligação com o outro mundo, era o petüm, o fumo misturado a outras ervas, preparado também em forma de charuto. Após se intoxicar ao engolir grande quantidade de fumaça, o pajé entrava em estado cataléptico momento de fazer contato com os espíritos. O transe determinava que o pajé estivesse possuído pelo ente sobrenatural. Theodor Koch, cientista alemão viajante pela Amazônia no início do século XX, em seu livro Dois anos entre os indígenas 1903-1905, descreveu os momentos finais de um índio: “Ouvi nitidamente os estalos das chupadas e os fortes sopros do pajé. Depois de cada ato curativo, ele corria para fora da casa [...] De tarde, três pajés realizaram atrás da casa do moribundo um grande exorcismo. [...] Na mágica da cura, o chocalho mágico tem papel principal. O pajé não se separa de jeito nenhum deste objeto precioso, ao qual ele atribui um poder misterioso”.
Os índios acreditavam que os pajés tinham tanto o poder da cura, como o de provocá-las. Atribuía-se ao feitiço, a causa das mais diversas doenças. A morte de um índio era vista como maldade de algum feiticeiro inimigo, que passaria a ser alvo de vingança. Caso o pajé não conseguisse tratar o doente, e se o mal se espalhasse para outros membros da tribo, todo o grupo deveria procurar outra “terra sem males”.
Para os padres do período colonial, todo poder dos pajés era culto ao demônio, manifestações que deveriam ser excluídas do povo de Deus. Impedidos de realizar seus rituais, os índios foram perdendo sabedorias repassadas, ao longo dos tempos, pelos seus ancestrais. Muitos desses saberes que os índios julgavam com poder de cura, não produziam nenhum efeito real, sendo de valor exclusivamente mágico. Outras sabedorias não eram fictícias, tinham valores medicinais e englobavam uma série de conhecimentos técnicos, complexos, que produziam efeitos reais.
Um dos mais importantes trabalhos sobre a medicina e os remédios dos índios brasileiros foi desenvolvido pelo alemão Karl Friedrich Philipp von Martius, em viagem que empreendeu através do Brasil, incluindo o Piauí, durante três anos, de 1817 a 1820. Martius percebeu o quanto era danoso para os índios, o contato e as imposições do homem branco que sacrificavam a sua cultura “[...] os brasis mostram-se logo incomodados e aborrecidos por tudo que afete de modo contrário à sua vida anterior; em breve definham em conseqüência de profunda melancolia e desprezo em que se acham; perdem o apetite e a agilidade dos membros; caem no abatimento geral [...]”.
Martius veio para Brasil, acompanhando a comitiva da grã-duquesa da Áustria, Leopoldina, esposa de dom Pedro I. Recolheu apontamentos para suas pesquisas botânicas, e no seu livro Natureza, doenças, medicina e remédios dos índios brasileiros, publicado em 1844, deixou anotações sobre a medicina dos índios brasileiros.
Antes de 1500, de forma geral, os brasis tinham boa saúde, vigor e longevidade. Disputavam, entre si, os espaços do território brasileiro mais privilegiados pelo clima e abundância de alimentos. Entre estes espaços, o mais cobiçado era o litoral, o que mostra a boa condição física dos Tremembés, que dominaram larga faixa da costa brasileira, desde o Ceará até o Maranhão, passando pelo Delta do Parnaíba e incluindo o Norte do Piauí.
No choque do contato entre o Novo e o Velho Mundo, os brasis levaram desvantagem, tanto em relação ao conflito armado, como na falta de resistência às doenças trazidas pelos europeus, para as quais os índios não tinham imunidade. O impacto de agentes patogênicos desconhecidos pelos nativos, como o da varíola, sarampo, coqueluche, tifo, catapora, difteria, gripe, peste bubônica, malária, e até a cárie dentária, já no século XVI, tinha dizimado grandes populações. Outro agente que favoreceu as epidemias foi a densidade dos aldeamentos, estratégia dos europeus para concentrar os índios num determinado local, e liberar suas antigas terras, para os colonos. Nesses aldeamentos, os índios eram aculturados e forçados em grandes tarefas.
Ao chegar ao Brasil, o homem branco não contava com a medicina europeia. Foram os jesuítas os primeiros a observar e usar as ervas indígenas. Criadas ainda no século XVI, as Casas de Misericórdia da Bahia e do Rio de Janeiro, no seu começo, instaladas em choças, se valeram das plantas nativas. Na época colonial, esses métodos de cura estavam presentes no cotidiano dos colonos. Uma das frutas observadas foi o caju, reparador da saúde dos escravos negros, na exaustão provocada pela longa e penosa travessia do Atlântico. Os cajueiros chegaram a ter proteção por decreto de Maurício de Nassau. O aça-iu, para os índios, significava ano, uma vez que contavam a idade a cada safra, o que permitiu se conhecer a sua longevidade. O guaraná, planta sagrada para os indígenas da Amazônia, era usada como suprimento de guerra, pela propriedade estimulante de aumentar a vitalidade, e como regenerador do organismo.
Pero de Magalhães Gândavo, em “História da Província de Santa Cruz” de 1567, foi o pioneiro ao descrever o óleo de copaíba como analgésico e cicatrizante eficaz, tornando-se um dos principais produtos de exportação do Norte do Brasil Colonial. Gabriel Soares de Sousa, em Tratado Descritivo do Brasil de 1587, prescreveu terapias aprendidas com os indígenas. Frei Vicente do Salvador, em História do Brasil de 1627, descreveu a flora brasileira com suas utilidades na medicina, e afirmou que “[...] não há enfermidade contra a qual não haja ervas em esta terra, nem os índios naturais dela têm outra botica ou usam de outras medicinas”.
A flora brasileira despertou Grande interesse nos cientistas dos séculos XIX e XX. Dom João VI foi um grande incentivador para o conhecimento das ervas do Brasil, quando mandou vir da Europa, comitivas de pesquisadores, como a dos naturalistas Spix e Martius. Países, como a Alemanha, no início do século XX, enviaram dezenas de expedições, principalmente para Amazônia, com o fim de catalogar, colher e estudar os princípios ativos desses vegetais.
Hoje, através da etnomedicina, que é o estudo da sabedoria específica das práticas empíricas de diagnosticar e selecionar plantas e dietas utilizadas como medicamento pelos nativos, procura-se conhecer, estudar quimicamente, e aproveitar esses conhecimentos na medicina científica. Pedro Paulo Funari, historiador e arqueólogo, em Arqueologia, livro publicado em 2006, afirma que “Cerca de 30% da população brasileira [61 mi de pessoas em 2009] tem alguma ascendência indígena e a influência indígena em nossa cultura vai da língua à culinária, passando pelos nossos costumes de asseio pessoal (os famosos banhos freqüentes)”. Os índios e o seu legado não são apenas páginas da história. Sua cultura, mesmo sacrificada, é parte do presente do povo brasileiro, precisando ser reconhecida e valorizada.
Considerando um povo sem Deus, os padres portugueses passaram a ver as práticas indígenas como demoníacas. Ao longo do período colonial, fizeram os brasis perderem grande parte de sua cultura, incluindo aí, os segredos da cura, riqueza adquirida ao longo de milhares de anos e extraída das florestas.
Uns dos primeiros relatos sobre a maneira como os índios se medicavam foi feito pelo cronista francês, Jean de Léry, em seu livro História de uma viagem a terra do Brasil, de 1578, no capítulo XIX, dedicado a práticas indígenas relativas às doenças e a morte: “Se acontece adoecer um selvagem, dá logo a conhecer em que parte do corpo lhe dóe, sendo esse lugar chupado com a bocca por algum amigo ou pelo pagé, embusteiro de genero diverso do carahiba e correspondente ao nosso barbeiro, ou medico. Os pagés fazem crer aos doentes que lhes arrancam a molestia do corpo e lhes prolongam a vida”.
A maioria dos índios da América considerava que o criador fez o homem através da música. Esta era o canal de comunicação com os espíritos que traziam saúde e as outras sabedorias transmitidas ao pajé, que tinha o poder de receber as mensagens e passá-las para a tribo, através de cantos. Cabia ao ente espiritual, determinar qual erva iria salvar o enfermo, tudo isso ao longo de rituais intermináveis. Vem daí, a grande importância da música, do canto e da dança para os índios.
A flauta, o maracá, tambores e cachimbos eram objetos de adoração do povo das selvas, que acompanhavam os índios em vários rituais, incluindo o de cura. Após muita bebida, como o cauim, bebida alcoólica feita através da fermentação da mandioca ou do milho, muito canto e dança, a música revelava o tratamento escolhido pelos espíritos para recuperar o doente: banhos, dietas, aplicação de calor e defumação, massagens, fricções, vômito, beberagens à base de plantas medicinais, escarificação no tórax e locais inflamados com objetos pontiagudos como dentes de animais, e até o isolamento do enfermo.
Para o pajé, a grande via de ligação com o outro mundo, era o petüm, o fumo misturado a outras ervas, preparado também em forma de charuto. Após se intoxicar ao engolir grande quantidade de fumaça, o pajé entrava em estado cataléptico momento de fazer contato com os espíritos. O transe determinava que o pajé estivesse possuído pelo ente sobrenatural. Theodor Koch, cientista alemão viajante pela Amazônia no início do século XX, em seu livro Dois anos entre os indígenas 1903-1905, descreveu os momentos finais de um índio: “Ouvi nitidamente os estalos das chupadas e os fortes sopros do pajé. Depois de cada ato curativo, ele corria para fora da casa [...] De tarde, três pajés realizaram atrás da casa do moribundo um grande exorcismo. [...] Na mágica da cura, o chocalho mágico tem papel principal. O pajé não se separa de jeito nenhum deste objeto precioso, ao qual ele atribui um poder misterioso”.
Os índios acreditavam que os pajés tinham tanto o poder da cura, como o de provocá-las. Atribuía-se ao feitiço, a causa das mais diversas doenças. A morte de um índio era vista como maldade de algum feiticeiro inimigo, que passaria a ser alvo de vingança. Caso o pajé não conseguisse tratar o doente, e se o mal se espalhasse para outros membros da tribo, todo o grupo deveria procurar outra “terra sem males”.
Para os padres do período colonial, todo poder dos pajés era culto ao demônio, manifestações que deveriam ser excluídas do povo de Deus. Impedidos de realizar seus rituais, os índios foram perdendo sabedorias repassadas, ao longo dos tempos, pelos seus ancestrais. Muitos desses saberes que os índios julgavam com poder de cura, não produziam nenhum efeito real, sendo de valor exclusivamente mágico. Outras sabedorias não eram fictícias, tinham valores medicinais e englobavam uma série de conhecimentos técnicos, complexos, que produziam efeitos reais.
Um dos mais importantes trabalhos sobre a medicina e os remédios dos índios brasileiros foi desenvolvido pelo alemão Karl Friedrich Philipp von Martius, em viagem que empreendeu através do Brasil, incluindo o Piauí, durante três anos, de 1817 a 1820. Martius percebeu o quanto era danoso para os índios, o contato e as imposições do homem branco que sacrificavam a sua cultura “[...] os brasis mostram-se logo incomodados e aborrecidos por tudo que afete de modo contrário à sua vida anterior; em breve definham em conseqüência de profunda melancolia e desprezo em que se acham; perdem o apetite e a agilidade dos membros; caem no abatimento geral [...]”.
Martius veio para Brasil, acompanhando a comitiva da grã-duquesa da Áustria, Leopoldina, esposa de dom Pedro I. Recolheu apontamentos para suas pesquisas botânicas, e no seu livro Natureza, doenças, medicina e remédios dos índios brasileiros, publicado em 1844, deixou anotações sobre a medicina dos índios brasileiros.
Antes de 1500, de forma geral, os brasis tinham boa saúde, vigor e longevidade. Disputavam, entre si, os espaços do território brasileiro mais privilegiados pelo clima e abundância de alimentos. Entre estes espaços, o mais cobiçado era o litoral, o que mostra a boa condição física dos Tremembés, que dominaram larga faixa da costa brasileira, desde o Ceará até o Maranhão, passando pelo Delta do Parnaíba e incluindo o Norte do Piauí.
No choque do contato entre o Novo e o Velho Mundo, os brasis levaram desvantagem, tanto em relação ao conflito armado, como na falta de resistência às doenças trazidas pelos europeus, para as quais os índios não tinham imunidade. O impacto de agentes patogênicos desconhecidos pelos nativos, como o da varíola, sarampo, coqueluche, tifo, catapora, difteria, gripe, peste bubônica, malária, e até a cárie dentária, já no século XVI, tinha dizimado grandes populações. Outro agente que favoreceu as epidemias foi a densidade dos aldeamentos, estratégia dos europeus para concentrar os índios num determinado local, e liberar suas antigas terras, para os colonos. Nesses aldeamentos, os índios eram aculturados e forçados em grandes tarefas.
Ao chegar ao Brasil, o homem branco não contava com a medicina europeia. Foram os jesuítas os primeiros a observar e usar as ervas indígenas. Criadas ainda no século XVI, as Casas de Misericórdia da Bahia e do Rio de Janeiro, no seu começo, instaladas em choças, se valeram das plantas nativas. Na época colonial, esses métodos de cura estavam presentes no cotidiano dos colonos. Uma das frutas observadas foi o caju, reparador da saúde dos escravos negros, na exaustão provocada pela longa e penosa travessia do Atlântico. Os cajueiros chegaram a ter proteção por decreto de Maurício de Nassau. O aça-iu, para os índios, significava ano, uma vez que contavam a idade a cada safra, o que permitiu se conhecer a sua longevidade. O guaraná, planta sagrada para os indígenas da Amazônia, era usada como suprimento de guerra, pela propriedade estimulante de aumentar a vitalidade, e como regenerador do organismo.
Pero de Magalhães Gândavo, em “História da Província de Santa Cruz” de 1567, foi o pioneiro ao descrever o óleo de copaíba como analgésico e cicatrizante eficaz, tornando-se um dos principais produtos de exportação do Norte do Brasil Colonial. Gabriel Soares de Sousa, em Tratado Descritivo do Brasil de 1587, prescreveu terapias aprendidas com os indígenas. Frei Vicente do Salvador, em História do Brasil de 1627, descreveu a flora brasileira com suas utilidades na medicina, e afirmou que “[...] não há enfermidade contra a qual não haja ervas em esta terra, nem os índios naturais dela têm outra botica ou usam de outras medicinas”.
A flora brasileira despertou Grande interesse nos cientistas dos séculos XIX e XX. Dom João VI foi um grande incentivador para o conhecimento das ervas do Brasil, quando mandou vir da Europa, comitivas de pesquisadores, como a dos naturalistas Spix e Martius. Países, como a Alemanha, no início do século XX, enviaram dezenas de expedições, principalmente para Amazônia, com o fim de catalogar, colher e estudar os princípios ativos desses vegetais.
Hoje, através da etnomedicina, que é o estudo da sabedoria específica das práticas empíricas de diagnosticar e selecionar plantas e dietas utilizadas como medicamento pelos nativos, procura-se conhecer, estudar quimicamente, e aproveitar esses conhecimentos na medicina científica. Pedro Paulo Funari, historiador e arqueólogo, em Arqueologia, livro publicado em 2006, afirma que “Cerca de 30% da população brasileira [61 mi de pessoas em 2009] tem alguma ascendência indígena e a influência indígena em nossa cultura vai da língua à culinária, passando pelos nossos costumes de asseio pessoal (os famosos banhos freqüentes)”. Os índios e o seu legado não são apenas páginas da história. Sua cultura, mesmo sacrificada, é parte do presente do povo brasileiro, precisando ser reconhecida e valorizada.
Fonte:http://www.proparnaiba.com/cultura/magia-e-cura-entre-os-indigenas.html
Medicina Indígena: Da Magia à Cura
Você vive outro tipo de realidade quando cresce lá fora, no meio da floresta, ao lado dos pequenos esquilos e das grandes corujas. Todas essas coisas estão ao seu redor como presenças, representam forças, poderes e possibilidades mágicas de vida que, embora não sejam suas, fazem parte da vida e lhe franqueiam o caminho da vida. Então você descobre tudo isso ecoando em você, porque você é natureza.”
A lagoa-apache, Edward s. Curtis (1868-1952)
De maneira geral, entre os índios, nas mais diversas aldeias, o tratamento e a cura de doenças é feita pelos pajés, através de práticas mágicas. Segundo a crença dos indígenas, esses poderes podem ser usados para curar doenças como também para provocá-las, razão pela qual é comum atribuir a origem de doenças aos feitiços.
Os processos de cura variam entre os grupos indígenas. Os Xamãs, por exemplo, são uma categoria especial de médico-pajé, que podem entrar em êxtase. Nesse estado, segundo os índios, a alma vai para longe do corpo, percorrendo lugares distantes ou encarnando um espírito estranho.
Dentre os índios, de acordo com Alan Suassuna, que escreve no site sobre o povo Yanomami, o Xamã é o líder espiritual, o intermediário entre os homens e os espíritos, que, durante rituais de cura cheira um pó alucinógeno que, acreditam, “abre” a floresta para os “Xapori”, entidades que auxiliam os Xamãs nos rituais de cura.
Segundo Joseph Campbell, em seu livro “O poder do mito”, “O xamã é uma pessoa, homem ou mulher, que, no final da infância ou no início da juventude, passa por uma experiência psicológica transfiguradora, que a leva a se voltar inteiramente para dentro de si mesma. É uma espécie de ruptura esquizofrência.
O inconsciente inteiro se abre, e o xamã mergulha nele. Encontram-se descrições dessa experiência xamãnica ao longo de todo o caminho que vai da Sibéria às Américas, até a Terra do Fogo”.
Para que se entenda mais de medicina indígena, é preciso mergulhar um pouco em seus mitos e rituais, uma vez que toda a sua cultura influencia sua saúde e a forma como lidam com seus corpos. No ritual de morte, por exemplo, os índios colocam o corpo pendurados em árvores.
Após algum tempo, quando o corpo já se decompôs, eles recolhem os ossos e cremam. Em rituais familiares os parentes misturam um pouco das cinzas ao mingau de banana e tomam. O restante é enterrado no mesmo lugar onde fizeram o fogo. Estes são outros indicativos das crenças mágicas dos indígenas.
Segundo o Dr. Rafael Valdez Aguiar, doutor em medicina e história, a medicina indígena, assim como muitas outras medicinas alternativas, tem muito a ver com a sugestão da pessoa, já que para que a pessoa adoeça ou se cure com recursos mágicos devem cumprir-se três aspectos: que o indivíduo creia, que a pessoa que o vai curar ou adoecer também creia, e que além disso, a sociedade em seu conjunto também creia.
Conforme escreveu Dorangélica de la Rocha, no jornal El Debate, do México, antes mesmo da chegada dos espanhóis, os índios já operavam catarata. Outras enfermidades graves eram curadas com recursos mágicos. A medicina dos indígenas é um milagre, uma magia.
Atualmente, a medicina indígena é um recurso para a cura de enfermidades graves, quando foram esgotados os recursos científicos, porque lida, principalmente, com a fé. Assim como muitas outras medicinas alternativas. Isso tudo não quer dizer que várias das ervas usadas pelos pajés e xamãs sejam descartadas pela medicina tradicional, pois muitas delas possuem princípios químicos ativos que, inclusive, vêm sendo objeto de pesquisa científica e que já compõem vários dos remédios que vamos procurar em farmácias.
Ninguém duvida, também, que a prática de exercícios físicos, dieta equilibrada, ausência de estresse e drogas, contribua para uma qualidade de vida melhor e que resulte em um estado de saúde, genericamente, melhor do que o do homem urbano.
O fato é que muitas das doenças com que lidam os índios em suas tribos são contornadas por sua prática médica. E muitas outras, desconhecidas por eles, os levam à morte. Não é de se admirar que a expectativa de vida indígena seja tão mais baixa do que a do homem urbano, que conta com os recursos de grandes hospitais e toda a alopatia dos grandes laboratórios.
Eficientes
No entanto, para Rafael Valdés Aguilar, doutor em medicina e história, antes da chegada dos espanhóis a medicina era sim eficiente, e resolvia boa parte dos problemas de saúde da população indígena do México. Segundo ele, a medicina é uma parte muito importante da cultura e o motivou no estudo dos grupos indígenas Sinaloenses.
Após anos de estudo e estando pronto para publicar o livro “Medicina prehispánica en Sinaloa y en el noroeste”, Rafael Valdés Aguilar afirma que a cultura indígena sinaloense realmente é pouco conhecida.
Professor da Escola de Medicina da Universidad Autónoma de Sinaloa (UAS), Valdés menciona que a medicina daqueles tempos não era uniforme. Explica que era uma medicina eminentemente mágica, embora contendo importantes elementos religiosos e empíricos. As religiões no noroeste do México eram muito elementares, o que torna ainda mais evidente o componente “magia” no tratamento das enfermidades.
Valdés complementa dizendo que os povos indígenas já conheciam mais de duas mil plantas medicinais e eram capazes de realizar operações e cuidar de fraturas ósseas. Tinham, ainda, técnicas mais avançadas de obstetrícia do que as da Europa, à época. De acordo com o professor, pode-se dizer que a medicina indígena é uma das expressões culturais que mais se mantém, desde essa época.
O doutor insiste que a medicina indígena era mais adiantada do que a européia, nos idos de 1400, ou seja, antes da chegada dos espanhóis nas Américas. Segundo Valdés, os índios podiam mesmo curar até enfermidades graves, como a sífilis. Todavia, hoje em dia, há recursos médicos muito melhores, assim, as práticas indígenas e a medicina natural, segundo o autor, estão fora de moda.
Além disso, Valdés acrescenta que a medicina natural é cara, pois há uma forte indústria de produtos naturais que determina os preços. Ele afirma ainda que, na medicina indígena, como em todas as outras, há muitas formas de charlatanismo. Da mesma forma, indica que os médicos científicos são preconceituosos sobre a medicina indígena, pois a desconhecem, porque está claro, para ele, que estuda seriamente os recursos curativos indígenas, que estes eram eficientes e, em alguns casos, seguem sendo.
Rafael cita algumas das substâncias usadas pelos índios: Cardon, com múltiplas propriedades medicinais. Aguacate, contra a caspa. Alcanfor, eficaz contra contusões e reumatismos. Cacao, tônico para o estômago. Calabaza, contra queimaduras e irritações cutâneas. Capulin, para o sistema nervoso, entre outros.
Os Índios Plains e as práticas modernas da medicina
Em novembro de 1998, no Museu da Universidade da Pensilvania, no pavilhão Jonathan Rhoads, houve uma exposição, onde foram exibidas fotos e textos sobre os índios. Dentre os materiais expostos na universidade, havia várias referências à prática médica dos índios.
De acordo com os materiais da exposição, as atuais crenças do sistema de saúde dos Índios Plains reflete uma mistura de tradições indígenas e práticas médicas modernas. Tradições e ritos, além de conhecimentos da medicina das ervas estão presentes. No estado americano de South Dakota, há o Hospital Traig Ht Clinic que é de medicina indígena.
Há círculos de medicina, onde os mais velhos transmitem experiências e conhecimentos aos mais jovens. Usa-se um cachimbo e há inscrições como: “Tabaco. Ele nunca ‘significou’ para ser abusado”.
Outro tratamento comum entre os Plains é a idéia de bem estar. Podendo ser definido como um estado onde a mente, o corpo e o espírito estão em conexão e “balanceados”. Um não pode ser separado do outro. Os Oglala Sioux são os mais tradicionais de todos os Índios Plains. Eles sempre trabalharam com as práticas e crenças de saúde desde o passado até o presente.
Para eles as doenças indígenas são causadas pela desarmonia entre humanos e os poderes sobrenaturais. Essas doenças devem ser tratadas pelas práticas nativas, não pela dos “homens brancos”, que servem para curar as doenças dos homens brancos, como a diabetes e os problemas cardíacos.
Traduz-se aqui uma prática muito mais “holística” em relação à medicina do que a tradicional e compartimentada medicina ocidental moderna.
Ervas e Medicamentos
De acordo com a FUNAI, Fundação Nacional do Índio, muitos vegetais usados pelos indígenas como medicamentos apresentam de fato resultados surpreendentes e, os conhecimentos técnicos, muitas vezes complexos, dos índios brasileiros, estão presentes tanto no combate às doenças, quanto na caça e na pesca (através da utilização de venenos), na ecologia, na astronomia, na fabricação de sal, de objetos de borracha, de tecidos e na guerra (uso de gases asfixiantes).
O Estado do Acre possui mais de 200 espécies de plantas medicinais catalogadas. Os habitantes da floresta sabem como utilizar toda a riqueza e as potencialidades das plantas. São bastante difundidos na região os medicamentos caseiros, que se utilizam das ervas e plantas da Amazônia como matéria-prima. Cosméticos são preparados à base de óleo de copaíba, e o pau-rosa é utilizado na fabricação de fixadores de perfumes e essências.
Anualmente, a prefeitura de Rio Branco promove, em conjunto com várias entidades, a Feira de Produtos da Floresta do Acre – FLORA -, com o objetivo de divulgar estudos e pesquisas sobre os produtos florestais não-madeireiros, criar mercados para os produtos da região, estimular seu consumo e atrair investidores.
Segundo informações do núcleo Amazon Trade, que estuda a cultura e os costumes da Amazônia, as ervas e a fitoterapia (medicamentos preparados a base de plantas, através de chás, infusões) são recursos muito utilizados pela população local e pelos índios. Como exemplos desses produtos, pode-se citar:
Pó de Guaraná, usado como tônico estomáquico, estimulante, contra distúrbios gastro-intestinais, diarréias. Ativa as Funções cerebrais e combate a arteriosclerose, as nevralgias e as enxaquecas, detém as hemorragias atua como calmante para o coração.
Óleo de Copaíba, utilizado por suas propriedades medicinais, no combate aos catarros vesicais e pulmonares, desinterias, bronquites.
Óleo de Andiroba, potente cicatrizante, anti-inflamatório.
Casca de Açoita Cavalo, contém óleos essenciais que atuam frente as disenterias, hemorragias, artrite, reumatismo, tumores, colesterol e Hipertensão.
Catuaba, tônico energético usado no tratamento de cansaço físico e sexual, insônia, nervosismo, falta de memória. Possui, ainda, propriedades anti-sifilíticas.
Semente de Sucupira, energético, anti-sifilítico, contém alcalóides empregados no tratamento de febres, reumatismo, artrite, inflamações, dermatoses.
Casca de Barmitão, potente anti-hemorrágico, anti-inflamatório.
Casca de Murapuama, tônico neuro-muscular, afrodisíaco, utilizado contra fraquezas, gripes, impotência, reumatismo crônico, etc.
Saracura-mirá, energético, usado no tratamento de cansaço físico, sexual, insônia, nervosismo, falta de memória.
Casca de Assacu, usado no combate às inflamações em geral, ulcerações, tumores.
Semente de Cumaru, propriedades medicinais que atuam reconstituindo as forcas orgânicas debilitadas, como tônico cardíaco.
Casca de Caroba, contém uma resina denominada “Carobona”, além de seu princípio ativo, o alcalóide “Carobina”. É diaforéticas (Cascas) e anti Sifilíticas (Folhas), debela feridas e elimina inflamações da garganta, afecções da pele, coriza, blenorragia, dores reumáticas e musculares, cálculos da bexiga.
Casca de Moruré, alivia as dores reumáticas, artríticas e da coluna verbal, estimulante do sistema nervoso e muscular.
Amêndoa do Açaizeiro, fornece um óleo verde-escuro bastante utilizado na medicina caseira, principalmente como anti-diarréico. O seu suco, de sabor exótico, possui grande valor nutritivo e contém altas concentrações de ferro, sendo bastante usado no combate à anemia.
Além de todos os produtos acima citados, a região norte do Brasil apresenta, ainda, outros derivados de plantas, como o Daime. De origem indígena, apresenta propriedades calmantes, mas sabe-se também que é pertencente à “família” dos perturbadores do sistema nervoso central, ou seja, é alucinógenas, tanto quanto a maconha ou o LSD.
O Daime dá origem a uma seita chamada de “Santo Daime”. O chá é chamado Ayuwasca, obtido da mistura do cipó jagube e da folhas da planta chacrona. Há várias comunidades na Amazônia que cultuam o Santo Daime, reverenciando a mata, a floresta, Deus e a alegria. As letras de seus hinos têm inspiração ecológica. Muitos renomados artistas e pessoas públicas entraram para esta seita.
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Extraído de: http://boasaude.uol.com.br
em 22/02/2003
Fonte:http://www.imagick.com.br/?p=4411
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